No meio social em Portugal o nome ainda vale alguma coisa. Ou vale o nome, ou vale o dinheiro, mas quem tem o primeiro não tem necessariamente que ter o segundo, enquanto que quem possui uma grande soma do segundo, com esforço, paciência e habilidade consegue ir tendo o primeiro. O importante é ter alguma coisa que distinga da maioria discreta. Talvez por isso a sociedade dita «bem» use e abuse dos diminutivos nos nomes próprios e pela mesma razão se estenda em apelidos longos, compostos de dois ou mais nomes de família onde não faltam os de e e para compor o ramalhete.
Assim, em lugar de Bárbara, Catarina, Luísa e Conceição, há a Bábá, a Katucha, a Bibicha (ou Lalu) e a Xaxão. E também há as Lelas, as Kikas, as Genas, bem como outros diminutivos deliciosos e muito interessantes do ponto de vista etimológico como a Batata, a Cenoura, a Boneca, a Picuxa e a Vicky. Sem esquecer a Dadinha e a Kiki, a Néné e a Lili que dispensam apresentações. Ou ainda a Beluca, a Bi, a Ni, a Kuka, a Belicha, a Nana, a Pachola e a Cocas, a Manita, a Mafuca, a Tatão, a Ruxa e a Lálá... E «at last but not the least» os diminutivos propriamente ditos, terminados em inha como Patinhas, Xandinha, Gracinha e Branquinha, a Silvinha e outros que agora não me ocorrem.
0 mesmo se aplica a eles. Os Franciscos são Quicos, os Ruis são Roys, alguns Pedros são Pipas enquanto que os António podem ser Nis, Tonis ou simplesmente Tós. E depois há o Pico, o Mim, o Tim, o Becas, o Licas, o Ninó, o Migas e o Petas. E ainda os homens-maria que também são nomes muito bem: o Zé Maria, o Gonçalo Maria, o João Maria, o António Maria, o Luís Maria e aqueles nomes inequivocamente na moda e que já não se podem ouvir como o Bernardo, o Martim, o Salvador, o Tomás, o Vasco e o Gonçalo.
Entre os tradicionais que caem sempre bem, sem hora nem geração contam-se nomes como Zé Filipe, Zé Miguel ou ainda Zé Luís. Ou os clássicos e mais ou menos aristocráticos que ainda não atingiram o ponto de saturação como Duarte, Pedro, Roque, Miguel, Joaquim, Filipe, Lourenço e Guilherme. Os nomes fora de questão e totalmente interditos são os duplos formados por nomes não tradicionais como Carlos, Armando, Paulo, Alexandre e Jorge e todos os neologismos inseridos pelo Brasil através das novelas e do futebol como Marco, Hélio, Helder, Ivan ou Igor. Numa mesa de chá aceita-se com algum fastio um Américo, um Asdrubal ou até mesmo um Serafim, mas um Nereu, um Glauco ou um Leandro são absolutamente inaceitáveis. A não ser que sejam fotógrafos de revistas cor de rosa e aí o caso muda de figura. Já se podem sentar e beber o chá à vontade.
Nos nomes delas, há vários já totalmente estafados como Carlota, Constança, Carolina e outros recentemente na moda mas com tendência para a vulgarização como as Franciscas e as Caetanas. Felizmente ainda subsistem os verdadeiros clássicos, que não ferem e ficam sempre bem como Luísa, Marta, Sofia e Madalena. Ou então Mariana, Mónica, Catarina, Maria do Carmo e Maria do Rosário (que acabam invariavelmente em Carminhos e Rosarinhos, mas não faz mal porque são diminutivos bonitos). E ainda Teresa, Joana, Graça, Cristina, Filipa, Isabel, Piedade, Bárbara, Beatriz, Benedita e Patrícia. E depois há as Marias com nome de homem que também são muito recomendáveis como a Maria José, a Maria Miguel, a Maria João, a Maria Manuel e, para terminar, o nome mais bonito e simples e também mais português de todos que co-existe pacificamente em todos os estratos sociais, que acompanha muitos outros nomes mas que fica invariavelmente bem sozinho, o místico e encantador simplesmente Maria...
Os nomes interditos são os duplos com estrangeirismos como Katia Vanessa, Marlene Susana, Jessica Sofia, Diana Paula ou Rute Rita. Também não são famosas nem bem vistas as combinações de nomes clássicos como Teresa Margarida, Marta Sofia, ou Rita Mafalda.
E depois há outro fenómeno interessantíssimo que são as pessoas que têm cara de. Como certos Antónios e muitos Gonçalos e ainda alguns Miguéis, que não podiam mesmo chamar-se outra coisa. Assim como algumas Mafaldas e Mónicas, Martas e Catarinas que não seriam as mesmas se tivessem outro nome...
É caso para citar com alguma subversão e abuso linguístico o ditado, diz-me como te chamas, dir-te-ei como és. Nunca conheci uma Sofia que não fosse ligeiramente mosca morta, uma Marta que não fosse totalmente espevitada, uma Filipa que não falasse pelos cotovelos ou uma Constança que não tivesse um ar enjoado. Nunca conheci um António que não fosse simpático, um Gonçalo que não fosse encantador, um Francisco que não fosse malandreco.
Texto de Margarida Rebelo Pinto publicado no suplemento DNA do Diário de Notícias, 1998
imagem de Fátima Rolo Duarte
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