(Nascer num local com um nome bizarro é carregar um fardo pesado num país em que gostamos muito de nos rir dos outros)
Aldeia das Gorduras, dos Ruins, dos Grilos, ou dos Porcos são nomes que só se podem encontrar em Portugal, baptizando terras.
É nos países mediterrânicos que a toponímia mais se aproxima da linguagem de todos os dias e que acaba por deixar uma marca.
Se na altura do «baptismo» o nome nada tinha de perverso, com o evoluir da língua, algumas das palavras tomaram outros sentidos, e os naturais renegaram o que antes era natural, por agora ser depreciativo.
Você gostava de dizer a alguém que nascera em Paneleiros de Baixo, sito na freguesia de São Gonçalo, na Guarda? Claro que muitas delas moveram os interesses para mudar de nome. Mas outras não.
Algumas, aproveitando-se do teor picante do seu nome, fazem com ele bom dinheiro para engordar os cofres e conseguirem fazer uma festa anual de arromba.
É o caso de Picha, pequena localidade perto de Pedrógão Grande, na Zona do Pinhal. Quem não deseja ter um cartaz anunciando «Divirta-se com as grandes festas na Picha»?
Outros locais há que não vêm no dicionário, e que se criaram com histórias que mais parecem vir da noite dos tempos ou de histórias que fariam as delícias de um Jorge Amado.
No litoral alentejano, lá para as bandas de Odemira, mais propriamente quando a estrada que vem de Milfontes entronca na que vai para Lagos, mesmo ali à quina, está um letreiro: «Portas do Transval.».
A este nome bizarro está ligada uma história à boa maneira alentejana, mas de que se não conseguem definir os contornos entre a verdade e a lenda. «São histórias da charneca», dizem os charnequenhos.
Mas aqui fica a história.
Dois jovens irmãos que emigraram para a África do Sul e ali fizeram vida vieram de volta e herdaram umas terras, ao virar da estrada de Milfontes para Odemira.
O que mais soube cair nas graças do pai ficou com o melhor monte e, em homenagem à terra africana onde ganhara fartos cabedais, botou-lhe o nome de Portas do Transval.
O outro irmão ficou com um montinho, que ficava por detrás do primeiro.
Cheio de raiva e por vingança terá chamado ao seu monte, que lhe calhou em partilhas..., as «Portas do Cu».
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Reportagem "Corografia Insólita", da autoria de Humberto Vasconcelos, publicada no Diário de Notícias de 01/12/1996
(A totalidades dos artigos dessa reportagem estão publicadas neste blog em 5 mensagens de Março de 2011)
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